domingo, 22 de março de 2009

Entrevista com Cleber Ferreira, Diretor de Redação do semanário aparecidense O Parlamento

 

São vários os fatores que definem a linha editorial de um veículo de comunicação, que vão desde a sua relação com as fontes e anunciantes até os critérios de seleção de notícias. Figura importante neste processo, o editor, além do responsável por coordenar e direcionar a atuação dos repórteres, também é o elo entre os interesses que permeiam a publicação. Para melhor compreensão das fases que envolvem criação e edição, conversamos com Cleber Ferreira, diretor de redação do semanário aparecidense O Parlamento, fundado em 1996.

Segundo ele, o estilo de texto praticado em seu jornal varia de acordo com a editoria: “Em Cidades, o texto é mais popular, na Social é mais artístico, e em Política é mais elaborado. Os fatos são os mesmos para todos os veículos, por isso o que muda é a forma de contá-los, para que o público tenha prazer na leitura”, explicou. Sobre as questões mais valorizadas, citou o texto, a estética e o espaço dado aos anunciantes, que é o que torna o jornal viável.

Com relação ao espaço dedicado aos textos, Cleber relativizou: “Cada caso é um caso. O Parlamento não economiza palavras nem enche lingüiça por causa de espaço. Se for possível contar uma notícia apenas com uma foto e uma legenda, é feito assim sem problemas“, afirmou. A proporção dedicada aos anunciantes é de 30%, mas segundo ele, este número pode variar de acordo com a demanda.

Único jornal de Aparecida, O Parlamento não é comercializado, o que lhe dá, segundo dados de pesquisa apresentados por Cleber, um público de 60 mil leitores: “Atualmente, estamos entre os quatro jornais mais influentes do Estado” apontou. Dentre as qualidades do veículo, incluiu a busca constante pela decodificação dos fatos, explicando causas e conseqüências, para que a informação possa sempre ser compreendida entre as classes menos escolarizadas.

Dentre o público do jornal, Cleber identificou dois perfis de leitor: um deles tem baixa escolaridade e pertence às classes sociais mais carentes, dos bairros periféricos. O outro é a minoria, com maior escolaridade e em busca de poder na cidade. Por isso, o grande pilar de O Parlamento é a ética: “Opiniões não são vendidas, e informações jamais são chutadas. A clareza na escrita também é fundamental”, salientou.

Com tiragem de 25.000 exemplares semanais, sendo 5.000 só para órgãos públicos e 20.000 voltados à população, O Parlamento tem algumas especificidades comerciais: “O jornal não aceita determinados tipos de anúncio, como motéis e empresas de empréstimo facilitado (putaria e picaretagem não entram). Já recusamos verbas da Avestruz Master, Banco Panamericano e Real Privê. Por outro lado, já tivemos mídias da Nestlé, Sorriso e Flamboyant”, comentou Cleber.

Segundo ele, o que desperta o interesse do aparecidense é notícia, seja o que for. Diz haver um bom relacionamento do jornal com seu público, porém, o espaço para as cartas dos leitores foi extinto após experiências desagradáveis com cartas de teor interesseiro.

A relação com os anunciantes também é tida como satisfatória, e Cleber diz não existir muro entre redação e departamento comercial: “Apesar de não haver interferências entre os dois setores, as parcerias são fundamentais entre ambos”. Sobre a relação com as fontes, disse ser respeitosa e muito valorizada pelo jornal: “Ao contrário de outros meios, O Parlamento busca sempre estar o mais próximo possível de suas fontes”, comentou.

Segundo Cleber, não existem assuntos proibidos em seu jornal. Porém, temas que possam estimular drogas, prostituição e violência são evitados. O Parlamento publica erratas sempre que necessário, mas investe-se muito na boa apuração das informações para evitar que o erro aconteça. O jornal também trabalha com pesquisas, que o ajudam a formular suas pautas: “Mas trata-se de um investimento caro que acaba custando alguns profissionais ao jornal”, lamentou.

Citou a fase atual como maior momento de superação do veículo: ”O jornal teve que enxugar a folha, reduzindo a equipe de doze jornalistas que tinha antes para apenas dois atualmente. Temos bons anunciantes na iniciativa privada, mas é difícil sobreviver sem a mídia oficial”, completou. Apesar disso, o jornal possui um patrimônio de cerca 10 milhões de reais. Hélio Alves é seu fundador e atual dono.

Dentre as histórias mais marcantes pelas quais o veículo já passou, Cleber relatou a cobertura pós 11 de setembro: “As Farc escolheram O Parlamento como único veículo no Centro-Oeste para divulgar imagens e fatos das atrocidades causadas pelo ataque norte-americano ao Afeganistão. Eles inclusive se propuseram a pagar pela divulgação. O jornal não aceitou o dinheiro, mas fez a publicação”, recordou.

A hierarquia em O Parlamento tem Hélio Alves como diretor geral, seguido do editor geral, diretor comercial, e diretor administrativo. Subordinados ao editor vêm os repórteres e arte-finalistas, mas, segundo Cleber, nem o presidente interfere nas suas decisões, por respeitar seu trabalho e experiência. Indagado sobre a questão ética do veículo, foi taxativo: “Não comercializar a opinião, pagar a equipe em dia e estimular a cordialidade na redação, sem dúvida”, afirmou.

O jornal utiliza o manual de redação do Estadão, com algumas adaptações. Segundo Cleber, não houve grandes mudanças na política editorial desde sua fundação, porém, as mudanças gráficas são constantes e necessárias. O planejamento semanal é pautado na programação da Câmara da cidade e nas atividades do prefeito: “As outras notícias são fechadas sempre no dia do acontecimento, para não ficarem frias”, completou.

Para uma boa edição, Cleber aposta que informação e qualidade estética sintetizam todos os critérios necessários. Na hora de contratar um repórter, nada de indicação ou currículo: “É contratado o profissional que sabe fazer. O importante é que saiba redigir um texto com clareza, e este é o critério fundamental que decide se será ou não contratado”, confidenciou.

Cleber confirmou o fato das novas tecnologias terem interferido na forma de produção do veículo: “Além de ganhar edições digitais, o jornal deixou de ser diagramado manualmente”, lembrou. Entretanto, o aproveitamento de matérias das agências de notícias é pequeno, já que só interessam ao jornal temas relacionados à Aparecida de Goiânia.

Sobre o espaço dedicado à opinião, o jornal contava antes com Alexandre Garcia como colunista, mas o espaço foi extinto, segundo Cleber, após o jornalista começar a "divagar" demais: “Hoje há apenas o editorial, que busca sempre trabalhar a educação popular através da explicação de fatos”, salientou Cleber.

O jornal não possui suplementos, mas trabalha com cadernos especiais esporadicamente, como no aniversário da cidade e no Rodeio Show: “São nessas ocasiões que o jornal tem a oportunidade de aumentar o faturamento”, confirmou Cleber. Segundo ele, as informações mais relevantes são aquelas referentes à editoria de cidades, que traz notícias dos bairros de Aparecida.

Concluiu falando como lida com as pressões no dia-a-dia de edição: “As pressões existem, e é preciso ter habilidade para lidar com elas, avaliando as razões de cada parte. Quando o jornal não vê razão em quem está pressionando, bate de frente. O Parlamento não pipoca”, arrematou.

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